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Lobby no Brasil é crime? Entenda o que diz a lei e o que pode mudar

  • Foto do escritor: Anna Carolina Romano
    Anna Carolina Romano
  • há 27 minutos
  • 5 min de leitura


O que é lobby e por que é importante?


A pergunta “lobby no Brasil é crime?” ainda é comum no debate público e revela não só a falta de regulamentação sobre o tema, mas também a persistência de um estigma que confunde práticas legítimas de representação de interesses com atos ilícitos. O fato é que o lobby, quando exercido com ética e transparência, é uma prática essencial para o bom funcionamento da democracia.


Representação de interesses como pilar democrático


A atuação organizada de empresas, organizações da sociedade civil, sindicatos e setores produtivos junto ao poder público é uma forma de garantir que decisões políticas, regulatórias ou administrativas considerem diferentes perspectivas da sociedade. 


Essa prática, conhecida como lobby, contribui para a pluralidade no processo decisório e fornece aos formuladores de políticas públicas dados e argumentos técnicos que qualificam o debate — o que o torna um dos motores da democracia.


Ainda assim, no Brasil, a palavra “lobby” é frequentemente associada a corrupção ou tráfico de influência, em grande parte porque o país nunca teve uma legislação específica que regulamente claramente essa atividade. 


A ausência de regras abre espaço para distorções, alimenta a desconfiança e dificulta o entendimento de que o lobby legítimo é uma ferramenta democrática, não um crime.


Quando o lobby é legítimo — e como ele se distingue de outras estratégias


Em meio à desinformação, é comum que o lobby seja confundido com outras práticas como advocacy ou campanhas de interesse. Embora todas façam parte do universo das relações institucionais e governamentais, há distinções importantes entre elas. 


O advocacy, por exemplo, costuma ser voltado à mobilização social, educação do público e sensibilização da opinião pública — estratégias amplamente utilizadas por organizações da sociedade civil. Já o lobby é mais centrado no diálogo direto com autoridades, com o objetivo de influenciar decisões específicas de forma estruturada e técnica.


Essas duas frentes são complementares dentro das estratégias de RIG, que envolvem desde o monitoramento legislativo até a articulação ativa com agentes públicos. 


Campanhas de interesse, por sua vez, costumam combinar os dois modelos, articulando mobilização social e interlocução direta com o poder público em uma mesma ação. Algumas dessas experiências são analisadas em exemplos de campanhas de lobby no Brasil.


Quatro pessoas sentadas à mesa conversando, três homens e uma mulher, todos com roupas formais, indicando uma reunião entre autoridades e lobistas
Lobby é a atividade centrada no diálogo direto com autoridades para influenciar decisões.

O lobby é crime no Brasil?


Não. Lobby não é considerado crime pela legislação brasileira. O que é ilegal — e deve continuar sendo combatido — são práticas como corrupção, tráfico de influência ou recebimento de vantagem indevida. O lobby em si, desde que feito com transparência e de forma institucionalizada, é legítimo e respaldado pelo direito constitucional de petição.


Apesar disso, a ausência de uma norma específica que estabeleça limites, regras de conduta e deveres para representantes de interesse e agentes públicos deixa a atividade em uma zona cinzenta. Isso gera insegurança jurídica, favorece desequilíbrios no acesso a tomadores de decisão e fortalece a percepção de que o lobby serve apenas aos grupos mais poderosos — o que reforça a urgência de uma regulamentação nacional.


O que propõe o Projeto de Lei de Regulamentação do Lobby?


A proposta mais avançada nesse sentido é o PL 1202/2007, aprovado pela Câmara em 2022 e atualmente em análise no Senado como PL 2914/2022. O texto define as interações entre representantes de interesse e agentes públicos como atividades legítimas e propõe a criação de um cadastro nacional de lobistas, além da obrigatoriedade de registro de agendas e transparência sobre reuniões e pautas discutidas com autoridades.


O projeto também impõe obrigações tanto aos lobistas quanto aos servidores públicos, com sanções administrativas em caso de descumprimento — incluindo advertência, multa ou, em situações mais graves, exoneração. Essa proposta se insere no esforço de regulamentação do lobby no Brasil, que vem sendo debatido há décadas.


Além disso, a proposta resgata princípios constitucionais já existentes, como o direito de petição, e dialoga com práticas que vêm sendo adotadas por diferentes entes da federação e instituições.


Segundo o Termômetro da Inteligov, que avalia a probabilidade de avanço de proposições legislativas com base em dados de tramitação e contexto político, o PL 2914/2022 tem atualmente cerca de 51% de chance de aprovação, o que pode mudar de acordo com as movimentações no Congresso. - como designação de relator, pedido de urgência, etc.


O que dizem os modelos internacionais


Experiências internacionais mostram caminhos possíveis para o Brasil. Nos Estados Unidos, por exemplo, o lobby é regulamentado desde 1946, com exigências rígidas de registro, prestação de contas e divulgação periódica de atividades e gastos. Já na União Europeia, a adesão ao registro de transparência ainda é voluntária, mas necessária para acesso às instituições, funcionando como um mecanismo indireto de controle e reputação.


Outros países, como o Chile, adotam uma lógica distinta: o agente público é quem tem o dever de registrar todos os encontros com representantes de interesse. Esse modelo inverte o ônus da transparência, oferecendo à sociedade um mecanismo eficaz de fiscalização. O comparativo entre esses modelos também está presente na análise sobre a regulamentação do lobby no Brasil.


O papel da opinião pública


Uma pesquisa do Instituto DataSenado mostra que o lobby não é rejeitado em sua essência, mas desperta cautela. A maioria da população concorda que a prática precisa ser regulamentada, especialmente para coibir abusos e tornar as decisões políticas mais transparentes. Esses dados reforçam a importância de qualificar o debate público — como abordado no artigo sobre lobby como motor da democracia.


Além disso, o estudo revela que a influência percebida de grandes setores econômicos como agronegócio e bancos é muito superior à de grupos como trabalhadores, ONGs ou cidadãos comuns — o que aponta para uma assimetria de acesso que a regulamentação pode ajudar a corrigir.


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Casos de impacto: o lobby e advocacy na prática

No Brasil, há diversos exemplos de campanhas de interesse que uniram mobilização social e interlocução direta com o poder público para gerar mudanças concretas.


A aprovação da Lei da Ficha Limpa, por exemplo, foi resultado de uma articulação que combinou pressão popular, coleta de assinaturas e diálogo com o Congresso Nacional. Já a Lei Maria da Penha foi impulsionada por uma ampla campanha de advocacy liderada por organizações da sociedade civil.


Mais recentemente, a reforma da Previdência contou com uma forte articulação entre governo federal e entidades do setor produtivo, além de uma campanha de comunicação voltada à opinião pública. Em todos esses casos, o fator comum foi a legitimidade da pauta, a organização das estratégias e a transparência da atuação — características também abordadas em conteúdos sobre advocacy no terceiro setor e estratégias de análise de conjuntura.


Portanto, o lobby no Brasil não é crime, mas a falta de regras claras ainda compromete seu pleno reconhecimento como ferramenta legítima de influência política. 


Regulamentar a atividade, como prevê o PL 2914/2022, pode ser um meio de garantir mais igualdade de acesso ao processo decisório, fortalecer a confiança da sociedade nas instituições e qualificar a formulação de políticas públicas com base em dados, diálogo e diversidade de vozes.



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