top of page

O Legislativo e a Transformação Digital

  • Foto do escritor: Inteligov
    Inteligov
  • 5 de mai. de 2020
  • 5 min de leitura

Atualizado: 3 de mar. de 2023

A transformação digital tem sido uma das principais pautas debatidas pelos mais diversos atores da sociedade nos últimos tempos. Com a alta na penetração da internet no Brasil, o tema tem ganhado destaque em quase todos os setores da economia e alcançado, também, os governos.


Em pesquisa elaborada pela BĆŗssola Tech – empresa que busca conectar cidadĆ£os e seus representantes, por meio da implementação de processos de transformação digital no poder pĆŗblico –, em 2019, foi possĆ­vel determinar algumas aplicaƧƵes do uso de tecnologia no legislativo. LuĆ­s Kimaid, CEO e cofundador da BĆŗssola Tech explica que, para isso, a aplicação de tecnologia no processo legislativo foi dividida em quatro grandes eixos: digitalização de processos de documentos; disponibilização de informaƧƵes e dados, ferramentas de participação na elaboração de proposituras; e uso intensivo de inteligĆŖncia artificial. Para ele, o objetivo da transformação digital legislativa Ć© o aprimoramento da efetividade do processo legislativo, representada na melhoria da produção legislativa.


ā€œA premissa do que convencionou-se chamar de LegisTech Ć© a qualificação do processo legislativo, com uma arquitetura que privilegia a Casa como um espaƧo de condução do conhecimento que jĆ” estĆ” presente na sociedade e precisa de processos e ferramentas para melhor canalizĆ”-loā€, afirmou. Em relação aos benefĆ­cios do uso de tecnologia no legislativo brasileiro, Kimaid afirma que ā€œa Casa Legislativa, por sua natureza que busca a construção de consensos, Ć© um late adopter de novas metodologias e ferramentas, e isso deve permanecer. Contudo, essa mesma caracterĆ­stica permite a experimentação e a incidĆŖncia da sociedade nos processos de tomada de decisĆ£o.ā€


Nesse sentido, oĀ papel do legislativo na construção de interaƧƵes inovadoras com a sociedade, segundo Kimaid, consiste no fato de que as Casas Legislativas tĆŖm uma capacidade Ćŗnica no Poder PĆŗblico, de testar novas ideias, com baixo custo polĆ­tico, social e econĆ“mico, dada a sua descentralização, representada pelos mandatos parlamentares. ā€œĆ‰ possĆ­vel pensar em soluƧƵes que passam pela implementação em menor escala. Isto se dĆ” atravĆ©s do uso do espaƧo de mandatos individuais ou grupos para testar ideias e construir expertise com teste em campo, com input de dados e experiĆŖncia dos usuĆ”rios envolvidosā€, explica.


Dessa forma, partindo de uma premissa onde a Casa Legislativa Ć© um espaƧo de condução do conhecimento jĆ” existente na sociedade, Ć© possĆ­vel que este espaƧo seja usado pela sociedade civil organizada, startups, iniciativa privada e academia para a construção de novas formas de exercĆ­cio da atividade parlamentar. ā€œUm processo de transformação digital nĆ£o deve ser limitado aos grupos de inovação dentro das casas legislativas, mas sim, contemplar a participação de outros atores da sociedade. A construção de uma agenda de transformação digital no legislativo parte desta premissa de abertura para a sociedade civil de forma qualificadaā€, completa.


A democracia digital e os desafios da transformação no parlamento

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pela primeira vez, quase dois terços da população brasileira possui conexão com a internet. O estudo We are Social, da americana Hootsuite, reforça o crescimento exponencial do uso da internet no país: o brasileiro navega, em média, nove horas por dia.


Com uma sociedade cada vez mais conectada, a organização de redes que se formam por meio de amplas coalizƵes com vĆ­nculos horizontais e conexƵes entre elementos diversos tem sido facilitada, assim como o custo cada vez mais baixo para acessar espaƧos de debate traz Ć  tona a possibilidade de participação no processo decisório, para amplas camadas da população. ā€œDessa forma, a incidĆŖncia polĆ­tica Ć© recondicionada, potencializando debates acerca de mudanƧas em dinĆ¢micas polĆ­ticas e institucionais que podem levar ao processo de transformação digitalā€, afirma Kimaid.


O processo para a construção de uma democracia digital, no entanto, apesar de avançado, impõe uma série de desafios. Para Kimaid, ao olhar sob uma perspectiva global, é possível ver países com iniciativas de implementação de tecnologia para solucionar desafios do poder executivo muito avançadas, enquanto as Casas Legislativas permanecem com processos inalterados, sem usar ferramentas que poderiam melhorar a sua efetividade. Ele explica que isso se deve aos fatores históricos e culturais das Casas, que precisam ser compreendidos para que possíveis soluções estejam alinhadas ao desejo de manter a tradição do processo legislativo em algumas dinâmicas. Para ele, os regimentos internos e demais nomenclaturas utilizadas em outros parlamentos ainda não contemplam um modelo de parlamento efetivamente digitalizado.

ā€œA mera rĆ©plica destas regras para uma dinĆ¢mica digital pode gerar incompreensĆ£o e resistĆŖncia por parte dos atores envolvidos no processo. Ɖ fundamental que os casos de sucesso sejam compartilhados para que aquelas pessoas que correram risco em implementar um projeto do tipo sejam reconhecidas e empoderadas, assim como mostrar Ć  aquelas casas que ainda nĆ£o comeƧaram seus processos de transformação digitalā€, afirma.


Ele ressalta, ainda, que entre as maiores dificuldades para a implementação de projetos de transformação digital legislativa estão o acesso à expertise e tecnologia, o apoio político na Casa legislativa e a aversão ao risco. JÔ no caso das Câmaras Municipais, especialmente as de pequeno porte, a maior dificuldade é o acesso à mão-de-obra capacitada para desenvolver projetos nesta Ôrea, assim como o acesso à tecnologia.


Apesar das adversidades, na comparação com outros paĆ­ses, segundo avaliação de Kimaid, o Brasil – em termos de transformação digital no poder pĆŗblico – vem galgando espaƧo de destaque, seja pelo desenvolvimento do Sistema de Deliberação Remota (SDR), seja pela rĆ”pida adoção (ainda em maioria nas capitais) de protocolos de melhorias em processos voltados para a digitalização, seja pelo aumento da velocidade de digitalização de serviƧos pĆŗblicos.


ā€œAinda hĆ” muito trabalho pela frente a ser feito pelo poder pĆŗblico brasileiro, principalmente no que tange conectar o que estĆ” acontecendo e desenvolver serviƧos digitalizados que proporcionem uma melhor experiĆŖncia ao cidadĆ£o, contudo podemos afirmar que nos Ćŗltimos 4 anos, ao menos, o Brasil vem ganhando destaque em transformação digital em comparação a diversos paĆ­ses que geralmente vem Ć  nossa mente quando pensamos em tecnologiaā€, declara.


O futuro da inovação no Poder Público

Segundo Kimaid, a inovação na gestão pública pode ser compreendida sob três principais óticas: melhorar algo que jÔ existe para ampliar o impacto positivo da organização na sociedade; adaptar algo jÔ previamente testado para um novo modelo de forma a tornar seu impacto mais exponencial; e desenvolver algo completamente novo para atingir ou superar uma ou mais metas organizacionais.


ā€œTendo isso em mente, as projeƧƵes, ainda mais considerando o cenĆ”rio atual, indicam que a curva de adoção e criação de processos e implementação de tecnologia no poder pĆŗblico cresƧa de forma histórica. Percebemos que a pauta vem sendo cada vez mais abraƧada e implementada na gestĆ£o pĆŗblica como um todoā€, afirma.


Para se ter uma estimativa, houve um grande salto da quantidade de laboratórios de inovação existentes no Ćŗltimo ano, que passou, em mĆ©dia, de 2 para 32. ā€œĆ‰ preciso favorecer os elementos que agem como catalisadores da inovação pĆŗblica, como metas organizacionais claras, reais e efetivas, criação de uma sandbox que propicie a valorização de tentativa e erro, criaƧƵes de incentivos e prĆŖmios de inovação, por exemplo. Para que essa projeção se cumpra, tambĆ©m Ć© necessĆ”rio fortalecer a trĆ­plice hĆ©lice do ecossistema de inovação, trazendo para perto do setor pĆŗblico os demais agentes, como academia, iniciativa privada, startups e terceiro setor. Com isso, facilitamos a troca de experiĆŖncias, a descoberta e o desenvolvimento de soluƧƵes, alĆ©m do maior entendimento desses agentesā€, completa.


Sobre a transformação digital de forma geral e o trabalho realizado pela BĆŗssola Tech, Kimaid reitera que ā€œos processos de natureza cidadĆ£ precisam estar conscientes de qual o impacto na experiĆŖncia do indivĆ­duo no exercĆ­cio da cidadania que cada mudanƧa pode causar. Projetos que busquem a transformação digital na sociedade precisam ter em sua centralidade o impacto demandado pelo cidadĆ£o e a construção de mecanismos que incluam aqueles que ainda nĆ£o estĆ£o preparadosā€.

bottom of page