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Foto do escritorAnna Carolina Romano

A nova lei de cotas raciais


Título do artigo com o punho de uma pessoa preta representando grupos étnicos-raciais

A desigualdade racial é uma chaga que assola o Brasil por toda a sua história, e que continua a marcar a sociedade. Em um país reconhecido por sua rica diversidade, a discriminação racial é uma realidade que permeia a fundação do país, se fazendo presente em todas as esferas da vida cotidiana. Nesse contexto, a Lei de Cotas Raciais emerge como uma medida para remediar as injustiças que historicamente afetam a grupos étnico-raciais.

Os impactos da discriminação racial no Brasil


O Brasil foi o último país nas Américas a abolir a escravidão, em 1888. Esse fato simboliza a herança de discriminação racial que se estendeu muito além da abolição. Após a libertação dos escravizados, o período não resultou em oportunidades para a população negra. Pelo contrário, este grupo étnico-racial enfrentou desigualdades sistêmicas que perpetuaram o ciclo de marginalização social e econômica.


A educação, por exemplo, era – e ainda é – uma das áreas mais afetadas pela desigualdade racial. O acesso limitado a escolas de qualidade, preconceito e discriminação eram obstáculos que limitavam as perspectivas de muitos afrodescendentes. Além disso, o mercado de trabalho refletia as desigualdades raciais, com negros e indígenas frequentemente excluídos de oportunidades de emprego dignas.

E embora se observasse o crescimento dos grupos étnico-raciais, a discriminação racial não se limitou ao período pós-abolição. Ao longo do século XX, a segregação racial se manifestou de várias formas, desde a discriminação nos espaços públicos até a falta de acesso a serviços básicos, como saúde e moradia. Dessa forma, a desigualdade racial, uma vez enraizada na sociedade brasileira, persiste como um problema intransponível.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que, em 2020, a população negra representava 56,1% da população brasileira, enquanto a população branca correspondia a 43,9%. No entanto, a presença negra em cargos de liderança e em posições de destaque continua sendo desproporcionalmente baixa, refletindo as profundas desigualdades sociais e econômicas.

Nesse cenário, a Lei de Cotas Raciais surgiu como uma tentativa de reverter essa realidade. Introduzida pela primeira vez em âmbito federal na Universidade de Brasília (UnB), em 2004, a política de cotas raciais procurou corrigir as desigualdades históricas reservando um número específico de vagas para grupos étnico-raciais. Esta medida pioneira rapidamente levou a discussões mais amplas sobre a promoção da igualdade racial no Brasil.

No entanto, a história das cotas raciais no Brasil não é isenta de controvérsias e desafios. A implementação da legislação e suas atualizações ao longo dos anos foram marcadas por debates acalorados, questionamentos sobre sua eficácia e críticas fundamentais sobre a justiça e a eficácia dessa abordagem.

A implementação da lei de cotas raciais no Brasil


Após a adoção bem-sucedida da política de cotas na UnB, outras instituições de ensino superior e empresas aderiram ao sistema. As cotas raciais buscavam corrigir as disparidades históricas, reservando um certo número de vagas para estudantes negros e indígenas.


Os resultados iniciais foram promissores. A presença de estudantes afrodescendentes nas universidades aumentou significativamente, e um número crescente de pessoas de grupos étnico-raciais ingressaram no mercado de trabalho. Isso foi um indicativo de que as medidas afirmativas impactaram positivamente essa população.


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Foi então que, em 2012, após muita luta do movimento negro, a Lei 12.711, ou como é conhecida, a Lei de Cotas, foi promulgada. Em linhas gerais, a lei visa garantir 50% das vagas nas universidades e instituições federais de ensino técnico de nível médio para pretos, pardos, indígenas, pessoas com deficiência e estudantes de escola pública.

As reservas das vagas devem seguir a proporção dos grupos minoritários que formam a população, de acordo com o cálculo realizado pelo IBGE. Ou seja, se uma universidade oferta 100 vagas, em um estado onde 20% da população é formada por pessoas pretas, pelo menos 10 vagas deverão ser destinadas a estudantes negros.

Porém, mesmo com as regras estabelecidas pela lei, existem alguns desafios na implementação das cotas raciais no Brasil que merecem destaque. Como por exemplo, a definição da autodeclaração racial, que é o critério mais utilizado para determinar a elegibilidade para as cotas, e é alvo de críticas e preocupações. Alguns grupos de interesse alegam que a autodeclaração racial é suscetível a fraudes e que critérios mais objetivos e subjetivos devem ser considerados.

Além disso, a questão da meritocracia é um ponto de debate contínuo. Os críticos das cotas argumentam que essa política pode ser vista como uma forma de concessão de privilégios e que as pessoas não seriam selecionadas com base no mérito e na capacidade, mas sim devido às cotas.

A nova lei de cotas raciais no Brasil


O Brasil continua em um processo de transformação em relação às questões raciais. A discussão em torno das cotas raciais é um sinal de que a sociedade está cada vez mais atenta à necessidade de combater o racismo e promover a igualdade de oportunidades.


O recente projeto de reformulação e ampliação do sistema de cotas no ensino federal, aprovado pelo plenário, representa um marco importante na contínua discussão sobre a igualdade de oportunidades e a promoção da diversidade no Brasil. O PL 5.384/2020, apresentado pela deputada Maria do Rosário (PT-RS) e relatado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), traz mudanças significativas que merecem uma análise mais detalhada.

Uma das mudanças mais notáveis propostas pelo projeto é a ampliação da concorrência nas vagas gerais. Candidatos cotistas agora terão a oportunidade de competir tanto nas vagas gerais quanto nas vagas reservadas. Isso significa que, se um candidato cotista obtiver nota suficiente para ingressar em uma vaga geral, ele terá essa opção.

A reserva de vagas será acionada apenas se os candidatos cotistas não conseguirem a pontuação necessária nas vagas gerais. Essa medida busca garantir que as políticas de cotas sejam equitativas e permitam a inclusão de candidatos com bom desempenho acadêmico nas vagas disponíveis.

Nesse sentido, o projeto não apenas amplia a política de cotas, mas também modifica os critérios socioeconômicos para sua aplicação. Além de levar em consideração a renda familiar per capita, o projeto reduz o limite de renda para um salário mínimo por pessoa.

Isso significa que um número maior de estudantes, que antes não se qualificaram para as cotas devido à renda ligeiramente superior, agora poderá se beneficiar dessa política. A ampliação dos critérios socioeconômicos reflete a intenção de abranger um espectro mais amplo de alunos em situação de vulnerabilidade.

Além das mudanças nos critérios de renda, o projeto também insere os quilombolas entre os beneficiados pela reserva de vagas. Anteriormente, as cotas eram destinadas principalmente a estudantes negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência. Agora, os quilombolas também serão considerados na política de cotas, reconhecendo a importância de abordar as especificidades desse grupo historicamente marginalizado.

O projeto propõe a avaliação do programa de cotas a cada dez anos, bem como a divulgação anual de relatórios sobre a permanência e a conclusão dos alunos beneficiados. Isso permitirá um acompanhamento contínuo dos resultados das cotas e a identificação de áreas que necessitam de melhorias. Além disso, o projeto prioriza o recebimento de auxílio estudantil para alunos optantes pela reserva de vagas que se encontrem em situação de vulnerabilidade social, reconhecendo a importância de apoiar aqueles que mais precisam.

Como é comum em questões de construção de políticas públicas, o projeto não foi aprovado de forma unânime. Alguns senadores expressaram discordância em relação a essa expansão das cotas raciais, destacando a preocupação com a qualidade do ensino superior e a possível redução dos padrões acadêmicos. No entanto, a discussão sobre a eficácia e as implicações das cotas raciais é uma parte intrínseca desse debate.

Aprovado no Senado, o projeto agora segue para sanção presidencial. A decisão do presidente determinará se as mudanças propostas se tornarão lei e, portanto, terão um impacto significativo na educação superior e técnica de nível médio no Brasil.

O acompanhamento de pautas que visam a diversidade e inclusão social são fundamentais para nortear a implementação de medidas afirmativas em instituições que reconhecem a importância de contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária.

Para monitorar esses projetos, notícias e políticas públicas, entre em contato com a nossa equipe e conheça as soluções da Inteligov!


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